Onde reside o amor

Depois de um grande desgosto de amor uma pessoa pode entregar-se à sua dor legítima, sentida e sincera, fazer o luto necessário durante o tempo que for preciso e depois respirar fundo, levantar a cabeça, fazer desporto, encarar cada dia como um desafio, descobrir um novo hobby, mas um desgosto de amor é sempre um desgosto de amor. E por vezes tão forte que nos rouba a vontade de viver.

Todos os anos há mulheres e homens que se matam por amor.
É verdade que ninguém morre de amor – embora algumas doenças, nomeadamente as do foro cancerígeno, possam estar associadas a grandes desgostos ou factores de stresse extremo e os cães morram quando perdem os seus donos – mas há e haverá sempre quem seja capaz de se matar por um amor perdido, uma traição, um abandono.


O que leva alguém a terminar com a sua própria vida por outra pessoa é algo que me transcende. É verdade que os estados amorosos mais profundos nos provocam uma sensação de fusão com o outro e nos dão a ilusão de uma unidade perfeita, única e irrepetível. Pelo menos é assim que fomos educados; o amor romântico tem de ser total, avassalador, eterno e imutável, estóico e intemporal, imune a todas as mudanças do mundo, inalterável, maior do que a vida. Antes e depois de tudo existe o amor e John dos Passos dizia que só há dois temas sobre os quais vale a pena escrever: o amor e a morte. Quando se unem numa obra ou numa vida, ganha a literatura e perde a humanidade.

Cada vez que a história de um suicídio por desgosto de amor se repete, através de notícias de jornais ou de pessoas conhecidas, fico perplexa. A vida não acaba quando acaba um amor. A vida só acaba quando o corpo morre e o coração pára de bater. A ideia de infligir a própria morte é ainda mais assustadora do que a de roubar a vida a outra pessoa.

Todos os dias assistimos em directo a situações em que a vida humana só sobrevive sob condições de tal forma violentas e precárias que põem a causa a capacidade de resistência dos seres humanos. E, no entanto, as pessoas sobrevivem. Sobrevivem a calamidades, doenças graves, desastres, torturas, prisões, morte de parentes, isolamento forçado, fome, medo, solidão, desespero. O que faz com que uma pessoa com uma vida mediana, uma casa, uma família, um tecto, filhos, um modo de vida e, por conseguinte, uma vida própria escolha a morte parece-me inexplicável.

Todas as religiões professam o amor a si próprio como um dos princípios basilares da condição humana. Tal como não podemos conhecer os outros se não nos conhecermos a nós próprios, também não podemos amar o próximo se não nos amarmos enquanto pessoas, se não valorizarmos o que temos de melhor e relativizarmos os nossos defeitos, aprendendo a ouvir a nossa voz interior como a nossa melhor companhia.
 
O amor reside dentro de cada pessoa e não fora dela.
E quem não o descobrir, está perdido.


2 comentários

  1. Perder quem se ama dói muito, muito... e isso mata, quanto mais não seja por dentro.

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  2. Oiiiiii, passando pra dizer que eu aqui gosto muito muito mais do seu blog. Menina, sério, é um dos lugares mais fofos que eu já entrei! Lindo demais, sem falar que tem tudo haver com o nome do meu, né... Tudo entre! rsrs

    Beijos, linda quarta-feira pra você!!!

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